O médico José Wilson Andrade, vice-presidente da Associação Pan-Americana de Medicina Canabinoide, esclarece que a esclerose múltipla (EM) é uma doença na qual o sistema imunológico do paciente desencadeia um ataque aos tecidos do próprio corpo (reação autoimune). O ataque ocorre nos neurônios do cérebro e medula espinhal, destruindo a bainha de mielina (tecido que recobre os nervos). Essa “desmielinização” compromete a transmissão dos impulsos nervosos, causando problemas motores e de sensibilidade. “A causa é desconhecida e não há cura. Espasmos e rigidez muscular, alteração da marcha, dor neuropática, fadiga, depressão e incontinência urinária são alguns dos sintomas. O paciente tem períodos de remissão e recaída muito variáveis. Corticoides e imunomoduladores são os medicamentos mais utilizados para o controle, ambos com diversos efeitos colaterais”, aponta.
Cannabis Medicinal
Segundo o especialista, a aplicação de canabinoides no tratamento da esclerose múltipla vem sendo estudada há mais de duas décadas e os resultados são positivos. O médico conta que a primeira medicação a entrar nas farmácias do Brasil, a base de canabinoides, foi aprovado pela Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) em janeiro de 2017 — Mevatyl, extrato balanceado de tetrahidrocanabinol (THC) e Canabidiol (CBD) cuja indicação é o controle da espasticidade na EM. José Wilson comenta que a dor crônica que acompanha os pacientes também mostra boa resposta aos fitocanabinoides, por seu potencial anti-inflamatório e diminuição da percepção da dor no sistema nervoso central. Ele explica que a ansiedade e depressão, sintomas presentes na maioria das doenças crônicas, também podem ser mitigados, visto que canabinoides agem nos receptores de serotonina. Além disso, a qualidade do sono e a modulação do apetite obtêm grande auxílio no tratamento, associado a uma mínima incidência de efeitos colaterais indesejados.
Conforme o médico, os canabinoides não são isentos de contraindicações, como qualquer medicamento. O THC, por exemplo, não deve ser usado em pacientes com histórico pessoal ou familiar de psicose e esquizofrenia; tal como pacientes com alterações cardiovasculares, gestantes e lactantes.
Tratamento com Cannabis Medicinal
De acordo com José Wilson, o tratamento tem um valor elevado no país, mas houve uma redução significativa. Ele lembra que o custo do fingolimode (imunomodulador) pode ultrapassar R$ 9 mil por mês, muito maior se comparado com o valor médio do tratamento com fitocanabinoides — estima-se o custo entre R$ 1 mil a R$ 2 mil mensais. O médico ressalta que a maioria dos estados já determinou a distribuição de canabinoides pelo Sistema Único de Saúde (SUS), movimento iniciado com a aprovação da Lei 17.618/2023, de autoria do deputado Caio França, em São Paulo. “Infelizmente, a esclerose múltipla ainda não consta no rol de patologias que devem ser beneficiadas, mas este fato deve mudar em breve”, finaliza.