Surge uma nova luz para afastar o risco da doença de Alzheimer, que atinge cerca de 50 milhões de pessoas pelo mundo, e de certas doenças cardiovasculares, outro problema extremamente prevalente e que pode ser letal. A notícia vem de um laboratório americano focado em terapias gênicas que tem se empenhado em pesquisas para neutralizar uma variante genética que comprovadamente aumenta a propensão tanto a enfermidade neurodegenerativa como a eventos cardiovasculares.
Trata-se do gene APOE, que codifica a apolipoproteína E (ou ApoE) e, normalmente, atua no transporte de lipídios e na regulação do metabolismo do colesterol. Estudos vêm demonstrando que a presença de um alelo específico – uma variação no DNA – aumenta significativamente a formação de platas beta-amiloide e emaranhados de proteína tau no cérebro, ambos fenômenos determinantes para o Alzheimer.
A detecção dos alelos da ApoE é feita por meio de testes genéticos, podendo-se utilizar a saliva, obtida de maneira apropriada. A coleta é simples e feita por profissional treinado. A hipercolesterolemia familiar é outro exemplo de alteração lipídica detectada por esse método de avaliação do DNA.
Quem possui a variante apresenta maior vulnerabilidade também para doenças cardiovasculares caracterizadas pela obstrução do fluxo sanguíneo para órgãos vitais, como coração e cérebro, elevando o risco de infarto e AVC. Nesses casos, as artérias são bloqueadas por depósitos de gordura em seu interior.
Outra característica de quem possui essa condição de base genética é a maior absorção de colesterol intestinal e o consequente aumento dos níveis de colesterol ruim (LDL) no sangue.
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Já os fatores que levam ao desenvolvimento do Alzheimer são variados e incluem faixa etária e histórico familiar. Mas pessoas com uma cópia daquela variação do gene APOE têm risco aumentado de duas a quatro vezes para desenvolver o problema e aqueles com duas cópias têm até 12 vezes mais propensão.
Diante dessa descoberta, a nova terapia proposta pelo laboratório promete “silenciar” o gene APOE “alterado, tendo potencial para neutralizar ou minimizar seus efeitos deletérios no sistema nervoso central e nas artérias. Basicamente, o tratamento consiste em introduzir no cérebro dos portadores de duas cópias de um alelo APOE e uma cópia de proteína APOE – encontrada no líquido cefalorraquidiano dos próprios pacientes e que têm função protetora.
Esse esquema inovador ajudaria a retardar ou interromper a progressão do Alzheimer, além de contribuir para a regulação do colesterol, minimizando consequências cardiovasculares. Estudos clínicos em andamento buscarão confirmar a segurança e a eficácia dessa abordagem.
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Embora tal variante genética da APOE eleve os riscos, por si só ela não define o desenvolvimento dos males neurológicos e cardíacos. Isso porque condições ambientais e do estilo de vida são capazes de modular a suscetibilidade associada a características pessoais.
Dessa forma, um cardápio balanceado, atividade física na rotina e outros hábitos saudáveis, como não fumar e controlar o peso, podem diminuir os níveis de colesterol e o metabolismo lipídico, minimizando ou retardando a probabilidade dessas doenças se manifestarem.
O conhecimento sobre a existência das variantes genéticas ainda facilita abordagens mais personalizadas por parte dos médicos na prevenção e no tratamento das enfermidades vinculadas a essas condições. São notícias promissoras como essas que trazem esperança para a chamada medicina de precisão.
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* Maria Cristina Izar é cardiologista, presidente da SOCESP (biênio 2024/2025) e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
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